sexta-feira, 29 de agosto de 2014

O passeio na feira hoje foi diferente

       

O passeio na feira hoje foi diferente, decidimos não apresentar o experimento que tínhamos combinado e então resolver ir só comprar e conversar com os feirantes. Ao invés das personagens transitarem na feira, nós percebemos nos feirantes a própria autoestima refletida em ações simples, mas que compreendemos que já é um potente atravessamento poético. 
       A primeira banca que fomos, foi a banca das flores, do seu João. Lá a gente estava querendo escolher um presente para os personagens, já que os mesmos se pareciam tímidos em adentrar na feira. Vimos as flores, escolhemos, não compramos no primeiro momento, conversamos com amigos que encontramos e pensamos... em primeiro passar por toda a feira, olhar e observar todos. Fomos até o outro lado da feira e, na volta, viemos comprando alimentos: banana, depois da banana escutamos o assobio característico de um dos feirantes, chegamos até ele e compramos beterrabas, ele comentou que as alfaces estavam frescas, e então as levamos. 
      E assim seguimos até o fim da feira, olhando alimentos, percebendo as pessoas que passaram pela feira, sentindo os cheiros... de maçã, bergamota, cebola. Vimos hortênsias grandes, compramos gengibre, até que chegamos na banca das feirantes... que já conhecemos de outras idas. Elas estavam arrumadas, principalmente uma delas, com olhares diferentes e, o mais interessante e que nos saltou aos olhos é que elas estavam escutando música. Isso nos chamou a atenção, pois nessa feira nunca havíamos escutado nenhuma música ou grito, é uma feira silenciosa. E esse dia foi um dia diferente. Elas comentaram: “a gente não conseguiu ouvir vocês na última apresentação, mas a gente consegue escutar daqui.” Isso para nós foi como se tivéssemos tocado elas de alguma forma, e numa banca que não havia música hoje já havia música. 
    Logo em seguida fomos para a banca das flores para comprar as flores para os personagens, conversamos com o seu João, ele comentou: “Eu colho as flores, hoje em dia ninguém quer trabalhar no campo... querem tudo ser doutor”. Trouxemos as flores para a sala de trabalho, nos perguntando se o seu João tem consciência da beleza de seu próprio trabalho, do quanto ele se faz presente de uma forma ou de outra, em outros lugares para além da feira.
Lembramos da cebola que ganhamos na última mostra e pensamos sobre o valor que ela tem, por todo o trabalho anterior para que aquele produto tivesse na feira, e que ainda não comentamos para a feirante que nos deu, que ela foi plantada. 
Então conseguimos ensaiar, os personagens surgiram com características destes feirantes, com os quais conversamos e que são fonte da nossa inspiração. Sentimos crescimento em termos de fluidez e organicidade nas cenas e ao fim, deixamos na sala o vaso com as flores colhidas pelo seu João. As flores do seu João foram nosso estímulo nesse momento, entre um personagem e outro, era como se conversávamos com as flores. Elas foram espectadoras de nosso ensaio.

Lumilan Noda e Tatiana Duarte

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Estreia do espetáculo Palco de Feiras!

O projeto está em sua fase final de montagem e apresentará o espetáculo na feira da Alberto Rosa no dia 12 setembro de 2014 às 10h da manhã em Pelotas.

Palco de Feiras! é um espetáculo teatral de rua com dramaturgia composta por cenas curtas inspiradas tanto em em textos clássicos como nas histórias dos feirantes e frequentadores das feiras livres de Pelotas/RS. Entendemos que a feira é um lugar de encontro, por isso ela é nosso pano de fundo. Compreendemos que a própria poética da feira é um bem cultural, assim o espetáculo busca valorizar e enfatizar a importância deste espaço para a sociedade.


Ficha Técnica:

Alexandra Dias - Direção

Tatiana Duarte - Atriz
Lumilan Noda - Ator

Thiago Rodeghiero - Produção e Cenário

Mariana Gomes - Figurinos

Teresinha Ávila Dias - Costureira

Preparação e Direção Musical - Luan Borba

Fotografias - Alan Fagundez




domingo, 24 de agosto de 2014

Fotos da 2º Mostra


<

Ficha Técnica:

Alexandra Dias - Direção

Tatiana Duarte - Atriz
Lumilan Noda - Ator

Thiago Rodeghiero - Produção e Cenário

Mariana Gomes - Figurinos

Teressinha Ávila Dias - Costureira

Composição Musical - Luan Borba

Fotografias - Alan Fagundez

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Segunda Mostra de Processo "Palco de Feiras!"

Mais um ensaio aberto na feira da Alberto Rosa, sexta-feira às 10h da manhã em Pelotas. O projeto está em fase final da pesquisa e de conclusão do processo de criação. Esta mostra é um dos últimos momentos de troca com o público sobre as relações e suas vivências neste lugar através, levando em conta os atravessamentos poéticos ali presenciados com os feirante e frequentadores.  

Evoéee! comprem tomate, bergamota entre o todo colorido que a feira oferece! Se divirtam!



Imagem de Alan R. Roja Fagundez 



Imagens de Lumilan Noda 







Tatiana Duarte 

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

O espetáculo "Palco de Feiras!" e sua característica musical

Foto: Itibage Mirapalhete
No último sábado, a Cia Olhar do Outro interveio cenicamente no "Mercado das Pulgas", uma feira livre de antiguidades que acontece todos os finais de semana nos arredores do Mercado Público Central de Pelotas. Eu, Lumilan Noda e a Tatiana Duarte, por sugestão da nossa diretora, fomos para lá viver uma das ações que estará presente no Palco de Feiras!: oferecer serenatas.

A introdução das serenatas na dramaturgia da peça, partiu do nosso olhar e sentimento acerca das pessoas que participam da Feira Livre do Porto, tanto feirantes quanto compradores, que são também figuras importantes dessa pesquisa. Nos veio a vontade de resgatar vivências de uma época anterior, e, pra isso, tocar e oferecer serenatas veio como uma bela possibilidade para trocar direta e poeticamente com essas pessoas da feira.

Mais um olhar fotográfico de Itibage Mirapalhete
O processo de musicalização desse trabalho está sendo desenvolvido juntamente com o músico e amigo Luan Borba, graduando em Música - Licenciatura pela UFPel. Luan tem trabalhado conosco referências que nos tem contribuído na relação entre corpo e música. Jacques Dalcroze e Instituto Brincante são algumas referências trazidas por ele durante os nossos encontros musicais, que tem sido um dia por semana.

Temos percebido que, para nós, não músicos, as intenções e fé cênica com os instrumentos tem sido em parte até mais prioritários que a afinação musical em si. O olhar tanto da diretora Alexandra quanto de Luan, apontaram para o fato de que enquanto havia preocupação em acertar a nota ou acordes do instrumento durante uma cena, a presença cênica se esvaziava. Porém, a mesma presença era recuperada quando o instrumento deixava de se tornar um problema a ser "acertado" para servir como efeito que potencializa a expressão do ator, mesmo que para isso errasse alguns acordes.

Luan Borba, Lumilan Noda e Tatiana Duarte (Foto: Thiago Rodeghiero)
por Lumilan Noda

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Palco de Feiras! - "Uma mesa é uma mesa", de Piter Bichsel, virou: "O Homem Cinza"

Desenho de figurino feito por Mariana Gomes para o personagem
O Homem Cinza

Traduzido e adaptado do texto Uma mesa é uma mesa, de Piter Bichsel.

Tatiana: - QUERO FALAR DE UM HOMEM VELHO, de um homem que não diz mais nenhuma palavra, que tem um rosto muito cansado, cansado demais para sorrir e cansado demais para se zangar. Ele mora em uma cidade pequena, no fi
m da rua ou perto do cruzamento. Quase não vale a pena descrevê-lo, não há nada que o diferencie dos outros. Ele veste um chapéu cinza, calças cinza, uma jaqueta cinza e, no inverno, o longo casaco cinza e tem um pescoço fino, cuja pele é seca e enrugada, os colarinhos brancos das camisas lhe são largos demais. 

Lumilan: - No andar mais alto da casa ele tem um quarto, talvez ele tivesse sido casado e tido filhos, talvez ele morasse antigamente em outra cidade. Certamente ele já foi uma criança, mas isso foi em um tempo em que as crianças eram vestidas como adultos. Pode-se ver isso no álbum de retratos de sua avó. No seu quarto há duas cadeiras, uma mesa, um tapete, uma cama e um armário. Ao lado da cama há uma mesinha e em cima da mesinha um despertador e na parede estão pendurados um espelho e um retrato. O homem velho fazia todas as manhãs um passeio e todas as tardes um passeio, trocava algumas palavras com seu vizinho, e todas as noites ele se sentava à sua mesa. Isso nunca mudou, também aos domingos era assim. E quando o homem se sentava à mesa, ouvia o tique-taque do despertador, sempre o tique-taque do despertador. 

Tatiana: - Então houve um dia especial, um dia com sol, não muito quente, não muito frio, com a cantoria de pássaros, com pessoas amigáveis, com crianças, que brincavam, e o especial foi que tudo de repente agradou ao homem. E Ele sorriu. 

Lumilan: (Sorri) - Agora tudo vai mudar.

Tatiana: - Ele desabotoou o primeiro botão da camisa, tomou seu chapéu na mão, apressou seu passo, até mesmo brincou com os joelhos e se alegrou. Ele chegou à sua rua, acenou para as crianças, entrou na sua casa, abriu seu quarto. Mas no quarto estava tudo do mesmo jeito, uma mesa, duas cadeiras, uma cama. 

Lumilan: - E, ao se sentar, ele ouviu o tique-taque e toda a sua alegria foi embora, porque nada havia mudado. Então o homem foi tomado por uma grande fúria. Ele viu no espelho seu rosto ficando vermelho, viu como ele es- premia seus olhos, então ele fechou suas mãos em punhos, levantou-as e bateu com elas no tampo da mesa, primeiro apenas uma pancada, depois outra, e depois começou a bater e gritar repetidamente: 

Tatiana: - “Isso tem que mudar, isso tem que mudar!”

Lumilan: - E ele não ouviu mais o despertador. Suas mãos começaram a doer, sua voz fraquejou, e ele então ouviu o despertador novamente, e nada mudou. 

Tatiana: - “Sempre a mesma mesa”, as mesmas cadeiras, a cama, o retrato. E para a mesa eu digo mesa, para o retrato eu digo retrato, a cama se chama cama, e a cadeira  chamam de cadeira. Mas por quê?” 

Lumilan: - Os franceses chamam a cama de “li”, a mesa de “table”, o retrato de “tablô” e a cadeira de “chéze”, 

Tatiana: - E eles se entendem. 

Lumilan: - E os chineses também se entendem. 

Tatiana: - “Por que não chamar a cama de retrato”,

Lumilan: - Plim! Então ele riu, e riu, até que o vizinho bateu na parede e gritou “quieto”! (Pondo o casaco) “Agora tudo vai mudar”.

Tatiana: - Chamou a partir de então a cama de “retrato”. 

Lumilan: - “Estou cansado, vou deitar no retrato!”, 

Tatiana: - E todas as manhãs ele costuma ficar bastante tempo deitado no retrato e pensou como ele queria chamar a cadeira, e ele chamou a cadeira de... 

Lumilan: - “Despertador”. Mas a mesa agora não se chamava mais mesa, ela se chamava tapete. De manhã o homem saía do retrato, se vestia, sentava- -se ao tapete no despertador e pensava, como ele poderia chamar as coisas. 

Tatiana: - A cama ele chamou de retrato. A mesa ele chamou de tapete.

Lumilan: - A cadeira ele chamou de despertador. O espelho ele chamou de cadeira.

Tatiana: - O despertador ele chamou de álbum de retratos. O armário ele chamou de cama.

Lumilan: - O tapete ele chamou de armário. O retrato ele chamou de mesa.

Tatiana: - E o álbum de retratos ele chamou de espelho.

Lumi e Tati: - Agora vocês podem continuar escrevendo a história. E então podem, assim como o homem fez, também trocar as palavras: 
TOCAR se chama PISAR:
GELAR se chama VER, 
FICAR se chama TOCAR,
LEVANTAR se chama GELAR, 
PISAR se chama ABRIR.

Tatiana: - Desse modo ele dizia então: de homem o velho pé tocava bastante tempo no retrato, às nove pisava no álbum de retratos, o pé gelava,  para que a manhã não visse.

Lumilan: - O velho homem comprou para si cadernos escolares azuis e lotou- -os de novas palavras, e então tinha muito o que fazer, e ele só era visto raramente na rua. 

Tatiana: - Então ele estudou novas denominações para todas as palavras e esqueceu cada vez mais as palavras certas. Ele tinha um novo idioma, que pertencia apenas a ele. 

Lumilan: - De vez em quando ele já sonhava no novo idioma, e então ele traduzia canções da sua 
época de escola para o seu idioma, e ele as cantava baixinho para si mesmo. (- Soltei a perna no chaPÉU, mas o chaPÉU, não viVEU, Doutura ChiCA, cuspiu-SE, da piscada, da piscada que o chapéu fez)

Tatiana: - Mas em pouco tempo a tradução já era difícil para ele, ele havia praticamente esquecido seu idioma antigo, e ele precisava procurar as palavras certas nos seus cadernos azuis. E ele ficou com medo de falar com as pessoas. Ele precisava pensar bastante, como que as pessoas chamavam as coisas. 

Lumilan: - Seu retrato as pessoas chamam de cama. Seu tapete as pessoas chamam de mesa. 

Tatiana: - Seu despertador as pessoas chamam de cadeira. Sua cama as pessoas chamam de armário. 

Lumilan: - E isso chegou a tal ponto, que o homem ria, quando ele ouvia as pessoas conversarem. Ele ria, quando alguém dizia: “Você também vai amanhã no jogo de futebol?” ou quando alguém dizia: “Agora já está chovendo há dois meses” ou quando alguém dizia: “Eu tenho um tio que trabalha na feira do Simões.” 

Tatiana: - Ele ria, porque ele não entendia nada disso tudo. Mas esta não é uma história divertida. Ela começou triste e vai terminar triste. O homem velho com o casaco cinza não conseguia mais entender as pessoas, isso não era tão ruim. Muito pior era, que as pessoas não conseguiam mais entendê-lo. 
E, portanto, ele não fala mais nada. Ele se calou.

Fim

Post por Lumilan Noda

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Textos e pesquisas

Nesta fase, todo o trabalho de ensaios está com uma entrega importante do grupo, o que inclui os textos que irão compor a dramaturgia, indicados pela nossa diretora, Alexandra Dias, além da pesquisa realizada junto aos feirantes da cidade de Pelotas.

Alguns textos já se fazem presentes para nós no processo:


"-Atenção, atenção! A farsa e a Máscara, tão antigas quanto o mundo, vão mais uma vez lhes mostrar a verdadeira história da humanidade. Eis que se levanta a cortina: o amor, a paixão, a sorte, todo este jogo, conhecido pelo nome de vida humana, vai desfilar diante de nossos olhos. Vocês vão poder rir, compadecer-se dos personagens."

Outros textos dos próprios feirantes também sevem de estímulo na criação de uma cena poética e sensível na construção de personas que ainda estão em fase de criação.




Textos dos Feirantes - Simões Lopes, a feira considerada mais antiga pelos feirantes do local.

Ector trabalha na feira já faz 10 anos, desde criança frequenta a feira com seus pais, o pai já faleceu, os pais eram feirantes, ele é de Canguçu, tem dois filhos uma menina e um menino. A menina tem 10 anos gosta de ir para feira pois conversa com os clientes e trabalha. Nas férias da escola, o que ela mais gosta de fazer é ir à feira. Já o menino gosta de ficar dormindo. O pai comenta que a feira do bairro Simões Lopes é a mais antiga da cidade e que os colonos não são mais a maioria dos feirantes.

"-Eu sou alemão mesmo, meu pai e minha mãe são alemães mesmo, meu avô veio da Alemanha."

Jussara é uma senhora que mora em Morro Redondo, cultiva os próprios produtos que vende, e "tem muitas histórias tristes e felizes por aqui", conta ela, "tenho 30 anos de feira". Jussara não gosta de circo, porque ela se sente desconfortável com saltos arriscados dos acrobatas.

"- Eles se machucam muito, essas frescura de se machucar eu não gosto."

"-Quando eu vou para lavoura levo meu rádio a pilha e fico escutando música gauchesca bem alto. Meu marido me chama e nem escuto."

"-Eu gosto de escutar musica e ver novela tudo junto, é bom para descansar a cabeça."

Raquel, polaca mais nova é que mora no Cinóte, pra quem vai para Capão do Leão. Ela conheceu seu marido em um jogo de futebol, ele chegou de moto e começaram a conversar com ela e assim foi até que se casaram ( envergonhada olhando para baixo, enquanto conta e revira as cenouras). Vinte e três anos de casamento e de feira com o marido, ele é feirante e por consequência ela se tornou feirante, eles tiveram 4 filhos, uma faleceu, as outras três não quiseram seguir o caminho da feira. A mais velha é formada, a do meio faz faculdade de educação física, a mais nova estava atrás de emprego e enquanto não arruma ela faz almoço para todos da família.

"-Nunca fui chegada em baile, nem meu marido."

Post Tatiana Duarte